quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Sorvete

Estávamos naquele papo gostoso entre amigas. Restaurante legal, clima super primaveril e o burburinho que só uma mesa de mulheres consegue produzir.

A conversa fluia entre comentários cotidianos, dúvidas sobre as fases dos filhos e confissões.

Sim, entre mulheres sempre nos confidenciamos. Seja sobre amenidades ou desejos secretos.

Somos assim, movidas por sentimentos. Compostas por hormônios. Os tais mensageiros químicos do corpo. Regulam mais de nossas vidas que nós mesmos.

E foi nesse vaivém de delícias do universo feminino que uma amiga largou:

- Depois dos 40 somos como um sorvete derretendo!

Socorro! Deu aquele estalo. Na hora me veio na mente a imagem daquele sorvete de casquinha do Mc Donald´s, que derrete num piscar de olhos.

- Calma, disse ela. - detalhando sua metáfora -o problema é que aos 40 nós queremos continuar nos baseando na pessoa que éramos aos 20 anos. Corpo, cabelo, pele...

Bingo! Ela tinha toda razão.

Nosso maior erro é exatamente estarmos competindo com aquele corpo que tínhamos no passado. Barriga de tanquinho. Comer e não engordar. Sol sem protetor.

Muito de tudo e nada de consequências. Pelo menos instantâneas.

O mundo gira, o calendário muda.

Nosso referencial a partir dos 40 deve ser da sessentona enxuta que queremos ser. Ok, mas vamos deixar claro. Sem exageros.

Carregando conosco nossas histórias e marcas. Isso somos nós. O melhor de cada uma. Nossa mais saborosa fatia. 

Cuidado sim. Exercícios físicos, óbvio. Mas sem a neurose que transforma mulheres em caricaturas de si mesmo.

Elas estão soltas por aí, assustando pela falta de noção. Meg Ryan, que foi tão incrível em Harry e Sally, hoje não me faria rir. Só chorar.

Isso sem falar naquela lista de famosas (e nem tanto) transformadas nas réplicas do palhaço Bozo.

Então naquela noite, entre borbulhas de espumante e largas risadas, descobrimos a "nossa américa".

A pergunta que não quer calar: como encarar esse momento em que as coisas começam a mudar definitivamente, sem nos perdermos de nós mesmas?

As respostas vieram em doses homeopáticas. Não sabemos. Não temos a menor ideia. Mas queremos.

Somos cria da geração de Renato Russo. Seus versos nos diziam para amar as pessoas como se não tivesse amanhã. E agora Renato, chegou o manhã!

Queremos saber hoje, qual a melhor receita para sermos "nós" amanhã?

Confesso que ainda não sei qual é a mágica. Recebi os primeiros fios de cabelo branco com cortesia. Mas depois, confesso que não fui tão gentil. Arranquei uma a um sem dó nem piedade.

Qualquer dia vou acabar encarando um tonalizade, mês sim, outro também. Mas de nariz torcido. Coisa boa aquela juba dourada que oscilava com tons de acordo com as estações.

O hidratante acaba mais esquecido do que lembrado, na prateleira. Os exercícios físicos estão na lista das “pendências”.

Nossa, quanta demanda chata. Tem gente que gosta, eu não.

Mas enquanto a gente não descobre a fórmula mágica, nosso grupo de amigas continua se reunindo e brindando.

E se o mestre Renato Russo nada nos disse sobre o que fazer. Atacamos de Almir Sater, um sertanejo. Porque um dos bônus da maturidade é a liberdade de pré-conceitos.

E enquanto o sorvete derrete, a gente vai lambendo a vida com muita vontade. Brindando, sorrindo e seguindo a canção!

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Velhos Amigos

Velhos Amigos
Quando se encontram
Trocam notícias
E recordações
Bebem cerveja
No bar de costume
E cantam em voz rouca
Antigas canções
Os velhos amigos
Quase nunca se perdem
Se guardam para
Certas ocasiões
Velhos amigos
Só rejuvenescem
Lembrando loucuras
De outros verões
E brindam alegres
Seus vivos e mortos
E acabam a noite
Com novas canções
Conhecem o perigo
Mas fazem de conta
Que o tempo não ronda
Mais seus corações

http://letras.mus.br/almir-sater/597199/